sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

sem lá voltar

Atravesso-a, sempre que no Inverno vou ver o mar da Nazaré, e nunca páro.
A Alcobaça de hoje é a Alcobaça da minha infância – o hospital de Caldas da Rainha continua a ser incomparavelmente melhor, o Mosteiro continua nu e sem guias com capacidade para o encenar, o trânsito é caótico, as pessoas falam demasiado alto, de uma forma tão peculiarmente irritante que é conhecida até em Lisboa, os rios continuam a parecer um esgoto, a cidade é um manto de sombras, de noite e de dia. E sempre velha, sempre em obras, sempre feia.
A Feira de São Bernardo é um ex-líbris, com a sua artilharia “pimba”. Só aí cidade e concelho se agitam, se acotovelam, se enervam, para se verem ao espelho, como num espectáculo de televisão. Dá-se ao povo o que o povo quer, e fica toda a gente contente. Dá-se aos jovens o que supostamente eles querem, mas os jovens, os verdadeiros jovens (os que não são uma projecção dos pais) não querem aquelas “bandas para jovens”, e os que têm a infelicidade de não poderem sair de Alcobaça nesses dias de “festa” só têm uma solução: os bares. Depósitos de adolescentes, demasiado embriagados, demasiado drogados, demasiado novos. Porque, tal como ao povo se dá o que ele quer ouvir, sem questionar, até que este passe a exigir aquilo a que o habituaram, aos jovens dá-se ambientes de discoteca, em cubículos, onde florescem bebidas brancas e marijuana. Porque quando esses jovens nasceram não havia, como não há na Feira de São Bernardo, verdadeira alternativa. Cresceram sem ela. E os que hoje, aos poucos a vão vendo surgir, resistem-lhe, por uma questão de habituação – “Burro velho não muda...”, dizem os nossos avós. Porque o Cinema chega pobre, e atrasado. Porque o Teatro é de refugo, e revisteiro. Porque os espectáculos musicais são a conta-gotas, e invariavelmente repescados do “Top+” (ou de “fundos de catálogo”, onde ganha o artista com a caridade, e a Câmara com a poupança, se não se deixar enganar...).
A suposta alternativa nocturna de Alcobaça passa hoje pelo “Clinic”, propriedade de David Mariano e Nuno Gonçalves. O primeiro, jornalista, com uma aventura falhada no “Público”, o segundo, músico dos The Gift, grupo do qual também fazem parte Sónia Gonçalves e dois elementos virtuais. O “Clinic”, bar ínfimo, com aspirações a espaço cultural, nem sempre abre, nem sempre tem público, e quando abre, é para a “elite”, o que em Alcobaça significa: novo-rico (normalmente acéfalo) e pseudo-intelectual (normalmente amnésico). Recomenda-se, portanto, pela fauna, e para perguntarmos ao porteiro porque é que a entrada é 10 euros, mas só uma vez.
Alheio a tudo, descansa o saibro. Tão cru quanto o mosteiro (sem livros, sem camas, sem tino, sem nada), revelar-se-á, com a Primavera, a metáfora mais perfeita de Alcobaça.